quinta-feira, 22 de maio de 2008

POUCOS TÊM MUITO

Dez por cento da população brasileira detêm setenta e cinco por cento da riqueza nacional.

A gente passou um bom tempo na escola aprendendo como dividir, como fracionar e também o sentido humano de repartir com igualdade todas as nossas tarefas e pertences.

Depois que crescemos nos deparamos com essa realidade.

Como é que vamos falar de ética, de igualdade, de bondade, de generosidade, fraternidade, de sanidade, com uma realidade numérica dessa magnitude nos assombrando.

Já não chega aquelas revistas especializadas em dizer quanto aquele personagem famoso ganha por segundo, se dando ao luxo de comparar com o fato de que, a cada vez que o famoso pisca o seu olho, ganha mais do que você ganhará por toda a sua vida.

Não vamos ser simplistas e acreditar que isso pode ser mudado ou fazer discursos panfletários contra os ricos e contra a má distribuição de renda.

Muitos fatores contribuem para isso e os desvios e erros estão divididos na mesma proporção que a riqueza, só que de forma invertida, ou seja: a grande maioria absoluta pobre é sempre considerada, por eles (os ricos), como os únicos responsáveis por essa concentração de renda desumana. E a maioria pobre acredita nisso e repete isso.

A verdade é que enquanto houver monarquias, castas, oligarquias, nepotismos, monopólios, grupelhos, apadrinhamentos, etc., sempre haverá distorções e alguns tendo mais do que outros.

Não basta apenas invocar a questão histórica dizendo que sempre foi assim ou até mesmo a questão genealógica de que uns, mesmo que começassem todos do zero, acabariam sempre tendo mais do que outros por seu tino monetário e, principalmente por sua abdicação de prazeres consumistas de que muitos não abrem mão.

O Brasil é um país, já constatado por números, que possui o maior abismo entre quem têm mais e quem têm menos. Esse abismo é que constrói todos os outros abismos que somos obrigados a ver e conviver.

Esse abismo é que constrói o fosso que separa a monarquia da plebe. A cadeira numerada, da geral.

O corredor do hospital úmido, do quarto com tela plana. A prisão mofada da viagem ao Caribe.

Ninguém nasce disposto a fumar crack.

Ninguém vai para a cama dizendo “vou botar no mundo alguém sem futuro.”

Quando nós lemos que tão poucos têm tanto, enquanto tantos têm tão pouco, a primeira idéia que nos vêm à cabeça é: quero entrar nesse grupo que tem tanto. Seja pela porta da frente, pela porta dos fundos, pelo telhado, dentro do latão de lixo, indicado por alguém ou até com um trabuco na mão.

Enquanto pensamos assim, não conseguimos, nem por um momento pensar em porque é assim.

E enquanto não conseguirmos parar para pensar em porque é assim, vamos celebrando a alegria dos outros e incutindo em nós mesmos que, infelizmente, nascemos para sofrer.

Só quando temos uma discussão familiar, é que essas coisas ficam escancaradas a nossa frente e a atitude mais coerente é encher a cara e jogar, um no outro uma panela vazia.

Eu sugiro fazer amor e escrever poesia. Como sempre se fez.

Sérgio Lisboa.

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