domingo, 2 de março de 2008

ROUBARAM O MEU ESTEPE



Os caras pararam com um veículo importado, que custa cinco vezes mais do que o meu, puxaram um fio que fica na bateria, pela parte da frente, logo abaixo do limpador de pára-brisas, com um arame fino pescaram o tal fio, cortaram o mesmo e acabaram, em segundos com todo o sistema de alarme que eu possuía, deixando o carro, completamente sem voz e sem luz, a mercê de qualquer chave para abri-lo e adentrá-lo.


Fizeram toda essa operação, com uma logística cara, com o tal do carro importado, que sendo roubado, ou não, influi nos custos do processo.


Tudo isso, não foi executado para levar o veículo para o buraco negro do comércio de veículos roubados, mas para simplesmente abrir meu porta-malas e retirar o meu estepe, que fica atrás do veículo, o que de fato consumaram seu intento ( basta escrever uma crônica sobre roubo que a gente acaba usando terminologias policiais).


A gente fica assustado, indignado e tudo que é “ado” possíveis, mas acaba pensando que os caras merecem. Tirei o chapéu.


Toda essa técnica, rapidez, logística, para levar uma simples roda com pneu. Uma só, não foram os quatro pneus e rodas. Se fosse numa loja comprar uma só roda e um pneu, novos, numa super-oferta, pois é um carro popular, gastaria, no máximo, duzentos e cinquenta reais. No mercado paralelo, talvez eu gaste a metade (cento e vinte e cinco). E eles devem vender pela metade, ainda do preço do paralelo (sessenta reais).


Mercado paralelo? Sou capaz de encontrar lá, o meu próprio pneu e roda e ainda pagar por eles.


Chegamos num momento em que compramos as coisas que eram nossas, nos mercados paralelos, pela metade do preço de mercado, e ainda comemoramos a pechincha.


A ironia do destino é que eu tinha no porta-malas, junto com o estepe, justamente naquele dia, uma compra que incluía camarão, bacalhau, queijos e vinhos, comprados com o cartão de crédito, que valiam bem mais do que o estepe (talvez cinco vezes o que eles iriam lucrar).


Mas eles são profissionais e não desviam sua atenção para outros itens que não fazem parte de seu catálogo.


O que eu posso dizer é que me senti honrado com o extremo profissionalismo dos ladrões, com sua técnica apurada, com sua objetividade, sua pró-atividade, para um item, que individualmente rende tão pouco.


Se precisarem de mim para intervir por vocês, num momento de greve por uma melhor reposição salarial, ou até mesmo para uma equiparação, com certos concorrentes da política, que não tem técnica nenhuma, apenas dão com as duas mãos, contem comigo.


Ah! Obrigado por não terem revirado as minhas sacolas de compras.


Sérgio Lisboa.




A NOVA VERSÃO DE MIM



Eu ouvi uma frase que achei bem interessante, que dizia, mais ou menos, assim: “Nós não envelhecemos com os anos, isso acontece com sapatos e carros, vamos, a cada dia evoluindo, aprendendo e melhorando e, quando chegamos a certa idade, estamos no auge, no melhor momento. Hoje eu sou a mais nova versão de mim mesmo”.


A mais nova versão de nós mesmos.


Estamos aqui, com toda essa experiência, conhecedores de todas as portas que dão choques, no labirinto de ratos de laboratório da vida, sentados na primeira fila, como espectadores privilegiados, assistindo ao espetáculo de descobrimento do mundo, de nossos filhos, sobrinhos e netos.


Estamos aqui, bem vivos, com palavras mais bonitas para dizer e com mais coragem para dizê-las.


Estamos aqui, um pouco longe daquele bando de amigos que tínhamos, mas abertos para um dia encontrá-los e quem sabe, não sair por aí, quebrando uma vidraça ou empinando juntos, uma pipa.


Estamos aqui, aquela eterna criança, que ficou mais pesada e lenta fisicamente, mas que multiplicou a velocidade de suas emoções e sentimentos.


Qualquer um de nós têm consciência, lá no seu íntimo, que quando éramos mais jovens, andavámos e corriámos mais rápido, tremiámos menos as mãos, e nossos corações eram bem mais disputados naquela época do que agora (a não ser pelos cardiologistas, nos dias de hoje).


Mas o que sempre tivemos e continuamos tendo é a nossa percepção de mundo, o nosso olhar para as coisas, as nossas lembranças e a maneira com que enfrentamos as situações que a vida nos coloca à frente.


Se não existissem espelhos, nós só nos surpreenderíamos de não conseguir mais escalar um muro de dois metros, mesmo muitos anos depois de nossa infância, na oitava tentativa, quando, então iríamos parar e achar que algo não estava mais igual a antes.


Para todos os que estão lendo esse texto, eu gostaria de parabenizá-los, dizendo : “Hoje você é a nova versão de você mesmo”.


Apesar de admitir, que para mim mesmo, o meu modelo,1980, era bem mais esportivo, termino citando Mário Quintana :


” Embora idade e senso eu aparente
Não vos iludais o velho que aqui vai:
Eu quero os meus brinquedos novamente!
Sou um pobre menino... acreditai!...
Que envelheceu, um dia, de repente!..."


Sérgio Lisboa.





MAL-HUMORADOS



Como tem gente mal-humorada no mundo.
Se você é um deles, e já começa a ler essa crônica achando defeitos, já aviso que “mal-humorado” é com L e com hífen, enquanto “mau humor” é com U e sem hífen. Dos demais erros ortográficos, pode reclamar a vontade.
Não vou dizer que temos que estar sempre, e, principalmente nas primeiras horas da manhã, com aquele sorriso tipo “Sílvio Santos”, mas ficar o dia todo, ou até mesmo durante todo o ano, de cara amarrada, também não dá.
Todo mundo já está careca de saber que a tristeza espanta as pessoas e também as coisas, pois ambas invariavelmente andam juntas, e que, o contrário, a alegria, o sorriso no rosto, é uma fonte de atração e ainda faz bem para a saúde.
Já ouvi dizer que pessoas mal-humoradas são espíritos que precisam evoluir, o que nos leva a pensar que aquele humor horroroso, que vem desde a idade média ou antes, vai assombrar várias encarnações, ainda.
São os “highlanders” do mau humor.
Atravessam o tempo, como vampiros, espalhando suas nuvens negras e sua escuridão, ao longo da eternidade, e não há estaca de madeira, em forma de sorriso ou crucifixos em forma de carinho, nem água benta, em forma de paciência, que os transforme ou que, ao menos, nos ajude a conviver com gente assim.
Nas poucas vezes em que temos uma alegria a compartilhar, em que nos sentimos bem, em que temos vontade de sair cantando e pulando (esses momentos ainda existem, gente!), damos de cara com aquele personagem de filme de terror, rosnando para nós e nos fulminando com o olhar, como a que nos dizer: “te manda com essa alegria daqui”.
Todas as publicações a respeito de auto-motivação, de mudança de comportamento, poder da atração, de pró-atividade, o segredo, etc., dizem que temos que ter atitudes alegres e positivas e, literalmente fugir de pessoas negativas, pois acabarão nos afetando de tal forma, que precisaremos de uma verdadeira lipo-aspiração em nosso campo energético, sem falar nas inúmeras cirurgias plásticas para colocar em ordem as pelancas criadas pelo baixo-astral.
Vamos, então, fugir de gente assim. Manter distância, pois é uma questão de saúde pública.
Evitar que esse vírus se espalhe e nos leve a um quadro de mau humor e tristezas, generalizado.
Só falta agora, vir os direitos humanos, alegando discriminação contra os mal-humorados e os negativos.
Desse jeito, vão acabar baixando o nosso astral.
Sérgio Lisboa.