quinta-feira, 1 de maio de 2008

ARREMESSADO PELA JANELA

Eu fico pensando o que é capaz de fazer o ser humano com sua inteligência, força de vontade, capacidade de transformação e de adaptação.

Todos os caminhos estão abertos, os que levam para uma melhoria geral, uma evolução espiritual, uma vitória da mortalidade contra a imortalidade, da eternidade contra a finitude e outros que levam para o lado oposto, para uma decadência constrangedora, para um abismo escuro e assustador.

Qualquer um que já tomou uma taça de vinho um dia, ou qualquer alucinógeno abridor de mentes, ou mesmo sem nada disso, ousou pensar diferente do que está estabelecido, pelo tempo ou pela força, contestam o que é o bom e o mau, o que é o certo e o errado, o que é pecado ou não.
Contestar é preciso, abrir a mente é imperativo.

Me perdoem os filósofos. O dualismo ingênuo era mais fácil de assimilar.

Houve um tempo em que se era ou do bem ou do mal.
Ou se era bandido ou se era mocinho.
Ou se era da luz ou das trevas.

O mundo chegou a um novo tempo.
O tempo em que tudo é possível.
Qualquer notícia, hoje, por mais inverossímil, por mais fictícia, não nos causa impressão, pois tudo no mundo moderno é possível de acontecer.

Se é noticiado que um homem vai conseguir dar a luz, bocejamos diante da televisão.
Se lemos que Jesus nunca existiu, simplesmente mudamos para um canal de desenho animado.

Minha mãe, com um conhecimento psicológico de causar inveja a qualquer especialista, sempre que eu e meus irmãos brigávamos por algum brinquedo ela pegava esse brinquedo, quebrava e jogava pela janela do edifício em que morávamos, deixando todos nós estupefatos, a olhar lá para baixo, com o choro trancado e vendo o brinquedo destruído e espatifado na calçada. A briga cessava na hora, pois a razão da mesma não mais existia.


Não basta apenas ter bigode e chegar a uma certa idade para ter filhos. É preciso uma maturidade de caráter e um grau de sensibilidade divinos para enfrentar essa tarefa, que infelizmente muitos não têm, fazendo mais por uma imposição social ou o que é pior, para a preservação da “linhagem”.

Ainda bem que eu vivi numa época em que só os meus brinquedos eram arremessados pela janela do edifício.
Sérgio Lisboa.

Um comentário:

Bomfim disse...

Caro Sérgio Lisboa,

Ainda quando mancebo, lembro-me que li um livro cujo fecho de ouro é " Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria.".E, ao passar os olhos pelas duas crônicas de 1º/5/2008, percebi que somos, realmente, a "miséria", pois quão ínfimas estão nossas descobertas, nossas disputas, nossos anseios...nossa vida.
Outrossim, quando em 1881,Machado de Assis, ao presentear a humanidade com esta obra, tinha consciência da falácia social que vivia e usou um "defunto autor"(e não um "autor defunto", como podem pensar) para se eximir de qualquer compromisso com a sociedade, estando livre para criticá-la e revelar as hipocrisias e vaidades das pessoas com quem conviveu;caro Sérgio Lisboa, use e abuse da denúncia tácita "dessa" sociedade, por meio da leve ironia e do humor, pois tu sabes, melhor do que ninguém: Quem sabe, faz ao vivo, improvisa, não precisa de "papagaios-de-pirata". E, Finalmente, "Ao vencedor, as batatas", pois creio ser a única coisa (usei "coisa", porque considero a "prostituta" da Língua Portuguesa,pois ela sempre está aonde falta alternativa intelectual)que restará ao suposto triunfante.

Forte abraço,
Emerson Soares Bomfim