domingo, 24 de fevereiro de 2008

SOBRE DECOTES E ROTTWEILERS



Tinha um colega, agente de trânsito, muito magrinho, que era muito inteligente, tinha duas faculdades, fazia contas impossíveis de cabeça, tinha uma memória fotográfica e sabia de cor a escalação do Manchester United, de 1950.
O problema dele era que para responder uma pergunta, levava mais tempo que internet discada para baixar um arquivo, ou seja, era muito lento. Quando era para anotar a placa de um carro, o tempo que ele levava para, decodificar a mensagem e olhar para o lado, correspondia ao mesmo tempo em que o carro chegava ao final da reta e fazia o retorno. Por isso que se dizia que se ele pegasse o cacoete de olhar sempre para o lado inverso do que deveria, a chance de visualizar os veículos era muito maior.
Tem uma coisa em que ele era muito rápido, vou contar para vocês: quando se tratava de mulher. E bota rápido nisso. Para observar mulher ele tinha uma rapidez assustadora, para responder para mulher, acabava aquele silêncio estático, e se tornava, no ato, um locutor de loja de varejo.
Que coisa mais incrível isso, deve ter uma região do hemisfério cerebral, responsável pelas sensações, que quando ativada, transforma um indivíduo catatônico em pró-ativo em primeiro grau.
Mas um dia, eu e o agente de trânsito, caminhávamos no canteiro central da avenida, quando parou ao nosso lado, um carro com um casal. O cara parecia um lutador de vale-tudo, com cara de muito poucos amigos, e fazendo o Alexandre Frota parecer um nerd. Ao lado dele, uma mulher, com um decote que terminava nos joelhos, com um par de seios grandes, firmes, bronzeados, etc. (não dou maiores detalhes, pois não reparei direito), enfim um par de seios que até o Clodovil olharia.
Mas quem estava comigo não era o Clodovil, e sim o nosso agente de trânsito. Imaginem a situação. Na mesma hora em que o carro parou, o agente de trânsito não só colou os olhos nos seios da mulher, e começou a babar (parecia o monstro Alien, abrindo a boca lentamente e a gosma correndo). Além disso, como se não bastasse, ele foi levantando seu braço, lentamente, com o dedo indicador esticado, como naqueles filmes de mortos-vivos e, para o meu pavor, apontou diretamente para os peitos da mulher.
O cara que estava com a mulher, que já estava de olho no agente, antes mesmo do carro parar, puxou o freio de mão, mostrou os dentes como um cachorro “rottweiler”, deu um grunhido assustador, e desesperadamente tentava desatar o cinto de segurança, para avançar na jugular do agente de trânsito.
Para a nossa sorte o cinto estava difícil de abrir (agora eu entendo porque se chama cinto de segurança) e deu tempo para o agente enviar uma mensagem para o cérebro, processar e enviar a resposta para a área de trabalho, antes da maior tragédia do trânsito brasileiro acontecer.
Ele com aquela mesma expressão de zumbi de filme B, quase parado, derrubou o gigante lutador e salvou-nos a todos do morticínio, como que por milagre, com apenas uma frase, dita em câmera lenta: “Ela está sem cinto de segurança”.
Sérgio Lisboa.

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