Bem cedo ele já estava na porta do órgão público.
Conseguiu, finalmente ser o primeiro.
Até que enfim ele seria atendido, depois de meses de espera.
Quantas vezes havia chegado na fila e ser surpreendido com cento e vinte pessoas na sua frente, para um número de quarenta fichas.
Ia embora desiludido e pensando como seria o desfecho daquela situação com as oitenta pessoas que não iriam conseguir uma ficha.
A sua chance seria somente se, um dia, ele conseguisse chegar bem cedo, na frente de todo mundo.
E foi o que ele fez.
Nem dormiu naquela noite e no meio da madrugada ele já estava acampado em frente à porta do prédio.
Aquela porta que era tão cobiçada. Aquela porta que era tão distante de um mero ser humano. Aquela porta que era tão intransponível, que parecia até a porta do paraíso.
Lá estava ele, o primeiro e único homem que havia chegado àquela porta, naquele dia.
Como um desbravador de continentes perdidos, de planetas, nunca dantes explorados, lá estava ele.
O primeiro e único.
O escolhido.
O dia já ia amanhecendo quando um outro concorrente foi chegando com aquele olhar para ele de surpresa. Aquele olhar de quem se pergunta: como ele conseguiu essa façanha?
Mais outro foi chegando, com aquele mesmo olhar.
E mais outro. Para todos eles ele dava uma virada rápida de pescoço, um suspiro e levantava a cabeça como faziam os gladiadores sobreviventes do Coliseu, com um olhar firme de superioridade, fixo para o céu.
Ele era um vencedor!
Até que se apresentou um adversário a altura.
Um fura-filas. È o pior adversário para quem enfrenta uma maratona em uma fila: um fura-filas.
O “modus operandi” deste profissional do caradurismo sendo demonstrado ali, ao vivo, diante dele, sem cortes ou efeitos especiais.
Chegou com a cara séria, com os passos firmes e foi direto para a porta, lá na primeira vaga da fila.
Realmente o cara era bom. Um profissional de respeito. Só que ali estava ele, o cara que não ia permitir que isso fosse feito bem nas suas barbas.
Pegou o fura-filas pelo cangote, puxou com força e mandou ele lá para o fim da fila.
O fura-filas, é lógico, tentou argumentar, mas ele, que não era bobo, não deixou ele sequer abrir a boca (sabia de seu poder de persuasão) e empurrou-o lá para trás.
O destino, sempre cínico e debochado, desenhou para ele, naquele dia, que ninguém apareceu para abrir a porta.
Seria feriado? Seria greve dos funcionários?
Foi quando, chegando quase ao fim da manhã e todos já, mais do que indignados, resolveram até, não tendo mais paciência nem voz, deixar (pasmem!) o fura-filas falar.
Ele, com aquela empáfia de um verdadeiro fura-filas profissional, apenas disse:
- Eu sou o atendente deste órgão público e o responsável pela chave e abertura do mesmo.
Eu apenas cheguei pela manhã para abrir e atender a todos vocês, mas fui jogado para o fim da fila, sem deixar que eu falasse.
Como já terminou o turno de atendimento, eu peço que os senhores voltem amanhã, bem cedo, para pegarem suas fichas.
Sérgio Lisboa.
Um comentário:
Mravilhosa, adorei, sem palavras,parabéns está te superando, arrancou boas risadas do Jair e de mim, bjs chefe
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